
Vi um grupo coeso, unido, que tal como eu, acreditava na empresa e naquilo que fazia. Nessa altura punha tudo o que era pedido na frente das suas prioridades, mesmo pessoais. Nunca mais, tenho essa certeza, farei novamente parte de outro grupo de trabalho assim. A idade é outra e os olhos abriram-se à bruta naquela época de má memória. Perdeu-se a inocência.
Como poderíamos calcular que o esforço e a dedicação de todos, fosse recompensada com um pontapé no fundo das costas, para viabilizar o recebimento dos milhões do PESEF por parte da TAP?...
Calculava eu e quem ali trabalhava que o facto de a Air Atlantis ser uma subsidiária da TAP poderia ser uma garantia, uma segurança, para um eventual mau desfecho da empresa, que os indicadores de desempenho difundidos na publicação mensal "Nós, Air Atlantis" contrariavam e contrariaram sempre até à última.
Lembro-me como se fosse hoje de um telefonema em Novembro de 1987, do director do serviço a bordo, a perguntar-me se quereria continuar a colaborar com a Air Atlantis na base de Lisboa. Apanhado de surpresa uma vez que a minha opção tinha sido ir para a TAP, ainda lhe perguntei se no futuro quisesse ir para TAP iria ser possível, ao que me respondeu que sim, que teria sempre as portas abertas.
Não o culpo de maneira nenhuma pela minha decisão, mas esta conversa foi mais um dos muitos factores que me fez mergulhar de cabeça numa empresa que me permitia fazer o que gostava, e acreditava eu, reconhecia o trabalho realizado. Em menos de dois anos, depois de ter entrado ao serviço, era chefe de cabine.
Quando soube no dia 14 de Janeiro de 1993, da intenção do encerramento da AIA, achei que de alguma forma seriamos reconhecidos pelo trabalho com provas dadas, e de alguma forma absorvidos pela TAP.
Não queria acreditar naqueles primeiros meses de 1993, que se poderia não dar valor à qualidade humana do grupo que ali estava. Que se poderia descartar pessoas daquela forma.
O inconformismo fez-me desde logo avançar com o Pedro Santos, o Paulo Dias, e o Jorge Marreiros que durante quatro meses nos juntávamos todos os dias numa sala do Sindicato do Pessoal de Voo da Aviação Civil, a enviar cartas, a procurar apoios ou saídas que pudessem ser uma solução mais suave do que um simples despejo no desemprego.
Lembro uma carta de entre muitas e que ainda guardo, enviada ao grupo parlamentar do PS, cujo líder na altura, o dr. Almeida Santos respondeu: “Gostaríamos de ajudar. Mas como? Num regime de maioria absoluta a fiscalidade parlamentar é ineficaz...” ou seja, dizia claramente que não podiam fazer nada. Quando alguns anos depois, o eng. Guterres constituiu governo e Almeida Santos era presidente da assembleia da república, voltei a enviar-lhe uma carta à qual respondeu com desejos de felicidades. Não será muito difícil tirar ilações disto, da política e dos políticos!
Produtividade no trabalho? Na aviação civil? Mais do que nós, nessa altura, parece ser impossível encontrar. Desde então para cá os exemplos de despedimentos colectivos abusivos são recorrentes. Os lesados são sempre os mais frágeis: os trabalhadores. Os que fazem a empresa.
Pena que o povo português não acorde. Que permita a repetição interminável da história. De histórias de má memória.